segunda-feira, 12 de setembro de 2016

A 3a visão ou sobre como emprestar livros pode ser surpreendente!

Como muitos da minha geração, também li essa obra que foi best-seller nos anos 70 em Portugal e que dava pelo nome de A 3ª Visão. Da autoria de um real, ou ficcionado, monge tibetano refugiado no Ocidente, de nome Lobsang Rampa.
Esta obra, juntamente com outras, como Viagem ao Mundo da Droga, Siddartha, A Erva do Diabo, O Despertar dos Mágicos e História Desconhecida dos Homens fazia parte do conjunto de obras míticas de referência dos adolescentes de então, e que quase ritualmente os liam, comentavam, discutiam e faziam circular. E que, de alguma forma, também contribuíam para enformar as suas visões do mundo envolvente.
Li esse livro pela primeira vez por empréstimo de algum amigo, e só mais tarde vim a adquiri-lo.
Mas por causa desse tácito acordo de empréstimos que fazia circular os livros, a obra não ficou comigo por muito tempo. Emprestei-o. O amigo a quem o emprestara foi, algum tempo depois, visitar uns conhecidos seus, e acabou por lá deixar o livro por uns dias para que o lessem, e da próxima vez que lá voltasse, trá-lo-ia.
Só que essas pessoas acabaram por se ausentar por largo período para o estrangeiro, e perdeu-se o rasto do livro.
Era esse geralmente o destino dos livros. Eu juntei várias obras que me tinham chegado por empréstimo ou cadeias de empréstimos sucessivos, assim como perdi outros quantos pelo mesmo processo.
Há pouco tempo, estando a minha mulher a arrumar umas malas de coisas suas em que já não mexia havia muito, encontrou um saco com livros dos quais estava a pensar desfazer-se, pois já não lhe interessavam.
Encontrei-a nessa tarefa, e descobri, entre os livros que lá tinha, um exemplar d’ A 3ª Visão.
Contou-me que o tinha havia anos, embora nunca o tivesse lido. Tinha-o emprestado várias vezes, mas sempre se preocupara que lho devolvessem, nunca se tendo desfeito dele. Ali estava ele, na minha mão, a provar esse zelo sem nenhuma razão consciente.
Folheava-o, enquanto ela me contava toda essa sua relação inconsciente com aquele livro, quando, chegando à última página, por uma lista escrita a lápis nessa mesma página, descubro que aquele livro era o MEU LIVRO, perdido há quase vinte anos.
Depois de eu ter contado como o perdera, e de ela ter referido onde e como o encontrara, demos com o ponto de ligação: ela fora viver para a casa de onde tinham saído as pessoas conhecidas do meu amigo que tinham ido para o estrangeiro. O livro, abandonado ou esquecido, lá ficara. A rapariga que depois veio a ser minha esposa recolheu-o e não mais se separou dele.
Sem ela mesmo saber porquê. Até ele voltar à minha mão.

Terá havido em tudo isto, 3ª visão ?


António Rei

5 comentários:

  1. Eu sempre fui um perito na milenar arte de emprestar meus livros e nunca mais tê-los de volta. Durante muito tempo isso me causou uma certa angústia, um certo descontentamento, pois passava dias lembrando das alegrias que meus livros sempre me trouxeram, relembrando o cheiro, a textura das páginas, tentando lembrar com exatidão as partes que mais me tocaram. Até que um belo dia tive em minhas mãos o meu primeiro livro do Castro Alves e nele tive o privilégio de garimpar o seguinte diamante do poema "O livro e a América": " Oh bendito o que semeia livros... livros á mão cheia... E manda o povo pensar..."
    Desde então desapeguei e sigo a semear livros por aí.

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