Mais um livro a caminho, graças ao esforço dos colegas Igor Teixeira e Rafael Bassi!
sexta-feira, 28 de agosto de 2015
terça-feira, 25 de agosto de 2015
O segredo é que não tem mistério algum – crônica da vida acadêmica
Esta semana resolvi matar uma
curiosidade: contei quantas bancas eu tinha integrado – entre mestrado,
doutorado e qualificações de ambos. Excluí as bancas de TCCs, EVINCIs e
concurso. Foram 66 (73, contabilizando-se as bancas de meus orientandos,
excluídas as qualificações deles), entre bancas das áreas de História (maioria)
e Letras. Até o fim desta semana, aumento a conta. O resultado do meu cálculo
me fez pensar nas coisas que venho dizendo ao longo dos últimos 10 anos (minha
estreia foi em 2005). São inumeráveis as particularidades, daí a graça, mas o
que se repete tem sido TÃO repetido, que resolvi rabiscar algumas notas. Em
primeiro lugar, se estive em sua banca, não pense que esse texto é para você, não
pense que reuni aqui todos os seus defeitos. Se ainda vou estar, acalme-se, dá
tempo de ajeitar! Se é meu orientando ou orientanda, não despreze o texto, pelo
tanto que já buzinei essas recomendações no seu ouvido, afinal, eu continuo
corrigindo algumas coisas que vivo falando, também para você...
Faça SUMÁRIOS! Desenhe a pesquisa
em sua mente, mas não considere que seu primeiro sumário é tão precioso assim que
não pode ser mudado. Ele deve ser alterado! Quando a gente pesquisa, parte de
hipóteses e elas podem ser confirmadas na nossa labuta ou não. Portanto, o
caminho também muda:
Que tristes os caminhos, se não
fora
A presença distante das estrelas!
A presença distante das estrelas!
(Mário Quintana)
Eu conheço muita gente que escreve
a INTRODUÇÃO no final do trabalho. Essas pessoas alegam que precisam saber onde
vão chegar para preparar o leitor corretamente. Eu não sou assim. Eu escrevo
primeiro a introdução e esse exercício organiza a minha escrita. É claro que
volto a esse texto depois do trabalho pronto, para fazer os ajustes. Na
verdade, eu volto muitas vezes para não me perder. O que precisa ter em uma
introdução? Veja acima que a maioria de minhas bancas e orientações foram e são
na área de História, então se você é de outra área, escreva-me, faça
comentários que eu respondo. Levando em conta a minha experiência, sua
introdução tem de esclarecer qual é o problema que a dissertação ou a tese quer
resolver! Sua questão (ou questões) deve ser clara, afinal é resultado de
reflexão, de experiência no tempo! Outra coisa: CUMPRA AS PROMESSAS QUE FEZ NA
INTRODUÇÃO! Se perdeu as promessas pelo caminho, é porque esqueceu seu
compromisso...
Apresente suas fontes ao leitor,
mesmo que vá construir um belíssimo capítulo com a discussão dos documentos
(aliás, isso é muito bom!). Fale sumariamente sobre as edições usadas; suas
escolhas teóricas e historiográficas; apresente sua metodologia e descreva as
partes que constituem a dissertação ou a tese.
Eu gosto muito quando a introdução
inclui o autor, sua trajetória, as hesitações da pesquisa..., mas não fique se
lamuriando! Tudo bem que o desafio é parte constitutiva da pesquisa, mas
lembre-se de que ninguém te obrigou a escolher o objeto, ninguém te mandou
aprender sânscrito, grego clássico, árabe... foi você quem quis! Se você quer
trazer a dificuldade, revele também como fez para vencê-la!
Existem pessoas que não gostam de
picotar os textos em subitens. Ok para elas, mas atenção: não se perca por aí.
Uma dissertação e uma tese são textos que possuem uma linguagem própria e
estrutura ampla o suficiente para caber a novidade, mas não escancarada a ponto
de se descaracterizar. Não ache que o texto é incapaz de abrigar a sua
genialidade..., cabe sim e cabe a nossa humildade frente ao conhecimento.
A estrutura de uma dissertação ou
tese precisa dar conta de desenvolver a resposta ao problema. Existe o velho
esquema (de que gosto cada vez menos, mas tudo bem): contexto, apresentação das
fontes, dos seus autores e resposta à questão. Mas você pode fazer diferente,
dependendo do problema, dos documentos, dos métodos! Um detalhe sobre a escrita
do contexto: antes de rechaçar esse exercício, lembre-se de que, se ele parece
monótono, é porque o autor, ou seja, você..., está refletindo pouco sobre a
apresentação da pesquisa história e ela é tão importante quanto a sua conclusão
bombástica. Desafie-se!
Não guarde todas as novidades para
a conclusão. Não mortifique o leitor prometendo revelar o segredo no último
capítulo. Por acaso você é Agatha Christie? Se
gosta do gênero, guarde o procedimento para um romance. Sabe por que implico um
pouco com aquele velho esquema, acima mencionado? Porque ele guarda a resposta
para 1/3 da dissertação ou tese! Acho injusto. Tudo em seu trabalho é
importante! Traga os documentos para a primeira página, faço-os falar, dê-lhes
vida, leve o leitor pela mão desde sempre. Aliás, realce no texto quando tiver
chegado a um aspecto fundamental. Valorize-se!
NÃO FAÇA PARÁFRASES! Se tiver de
citar alguém, abra aspas e traga a voz do outro para figurar em seu texto,
identificando-o com uma nota. Não tema citações longas. Se elas são
necessárias, ok, mas você deve explicar por que a longa citação é fundamental
ali. Deve mediar a colaboração da voz do outro em seu texto. Eu só vejo uma
razão para aquela nota solta, sem aspas, ao final de uma frase ou parágrafo:
você se lembrou de alguém que também pensou a respeito do tema e quer mostrar
que leu essa contribuição. Ótimo! Erudito! NUNCA pegue o que o outro disse e
salpique com palavras suas...
Cuide da revisão! Não ache que,
porque tem 30 dias para entregar a versão final depois da defesa, está
autorizado a distribuir para a banca um texto desleixado. Isso é desrespeitoso.
Todo mundo entende uma gralha aqui e ali, mas não dá para largar orações
subordinadas sem oração principal a cada 3 páginas, desprezar a concordância, a
regência... Não incluí a crase, muito embora...
Não se considere incompreendido em
sua genialidade porque seu orientador mandou (sim, esse verbo existe) você
cortar 40 páginas do texto. Eu cortei 30 e vivi 3 anos com artigos extraídos
desse corte. Fiz muita coisa legal com páginas que NÃO cabiam na tese, ou seja,
que não tinham nada a ver com o problema a que me propus.
Mencionei o orientador e queria
encerrar com ele. Detalhe: você o escolheu. Mais uma vez: VOCÊ O ESCOLHEU.
Quando estiver no auge da crise, pergunte-se: POR QUÊ? Porque CONFIOU nele.
Essa confiança inclui diálogo franco (nem preciso dizer que de ambos os lados,
afinal, trata-se de diálogo). Não suma!!! Converse com seu orientador. Fale
sobre suas dificuldades e, juntos, vocês encontrarão maneiras de resolver os
problemas. Fale sobre suas descobertas, sobre seu desejo de ousadia. Juntos,
vocês encontrarão o meio termo necessário entre as exigências da dissertação ou
tese, sua ousadia, as respostas provisórias (são sempre assim) e a novidade!
PS.: Reparou que me referi sempre ao leitor e só uma vez à banca? Tenha a ambição de ser lido e bem lido por mais pessoas! Não imite o hermetismo dos outros. Minha experiência me ensinou que ele é a máscara dos medíocres.
quinta-feira, 20 de agosto de 2015
Dica de leitura!
Divulgo entre meus visitantes mais um número da Revista Diálogos Mediterrânicos!
http://www.dialogosmediterranicos.com.br/index.php/RevistaDM/issue/current
Bos leitura!
http://www.dialogosmediterranicos.com.br/index.php/RevistaDM/issue/current
Bos leitura!
sábado, 15 de agosto de 2015
Leitura inacabada - crônica e palpite
Um
dia, eu vou escrever uns Cadernos,
com resenhas de leituras incompletas. Como assim? Vou reunir as coisas que
penso enquanto leio, movida pelo toque na página e pela repetição de uma frase que
me seduz, quando o que falta é ainda enorme e mistério. Vou escrever de olho no
que já li, esquecida do que falta. De frente para o abismo.
Um
treino: Joanot Martorell tem me levado na conversa, a mim e ao Vargas Llosa,
com as aventuras de Tirant (Tirant lo
Blanc). Fui aos banquetes, enxuguei o sangue das lutas que salpicou meu
pijama e fiquei inebriada com a beleza de Carmesina. Estava ela de luto, protegida
por cortinas, entregue à sua intimidade, tanta que tinha a blusa aberta... Tirant é tomado. Descontrola-se, normal
nele... Um exagerado do século XV! Não
ignora que é uma senhora de alta linhagem – Princesa de Constantinopla!, acima
dele... Quando pensa em homenageá-la com um presente, o que escolhe?
O QUE ESCOLHE?
O QUÊ?...
UM LIVRO! Pronto! Fisgada... eu! Joanot
Martorell, eu e o Vargas Llosa, na sua conversa...
sábado, 8 de agosto de 2015
Uma confusão de sentidos - crônica
A
leitura d’A Fisiologia do gosto de
Brillat-Savarin tem me levado a prazerosas associações. Ao conversar com minhas
alunas sobre os seis sentidos – sim, porque há genésico, do amor físico que impele os sexos “um para outro”,
pensei no poema de Almeida Garrett, “Os cinco sentidos”. Nesse poema
maravilhoso para dar (ou para se declarar) a quem se ama, o poeta aborda cada
sentido, em particular e em separado:
São
belas – bem o sei, essas estrelas
Mil
cores – divinais têm essas flores;
Mas
eu não tenho amor, olhos para elas;
Em toda a natureza
Não vejo outra beleza
Senão a ti – a ti!
Divina
– ai! Sim, será a voz eu afina
Saudosa
– na ramagem densa, umbrosa.
Será;
mas eu do rouxinol que trina
Não oiço a melodia,
Nem sinto outra harmonia
Senão a ti! – a ti!
Mas
as interjeições e as repetições de fim de estrofe – um velho eco das cantigas medievais
de refrão? – ameaçam o esquematismo e apontam para a confusão dos sentidos, onde
julgo encontrar a “pequena morte” de Bataille:
A ti! Ai, a ti só
os meus sentidos
Todos n’um
confundidos,
Sentem, ouvem,
respiram;
Em ti, por ti
deliram.
Em ti a minha
sorte,
A minha vida em ti:
E quando venha a
morte,
Será morrer por ti.
Se
Garrett tivesse lido Savarin teria se confundido?
“Seus”
sentidos me levam a um poema que costumo recitar. Trata-se de “De tarde” de
Cesário Verde. Tudo parte de um pic-nic, em que “houve uma coisa simplesmente
bela”: uma mulher se livra da sua montaria para colher flores. Gesto sem aquarela,
se não fosse o seu desdém pela etiqueta da cidade... Ora, seu desprezo às “imposturas
tolas” a faz descuidar-se do decote:
Mas todo púrpuro a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro de papoulas!
Há
nesse poema a beleza do decote, daquilo que ele mal esconde..., mas o que me
embriaga é mesmo a confusão entre o paladar e a audição: degustar e ouvir um
dos versos mais bonitos da Língua Portuguesa – “A um granzoal azul de grão de
bico”! A culpa é desse som fricativo, portanto demorado, que se produz com a ponta
da língua. Tão bonito quanto ele é “O mar protesta contra não sei quê” de
Miguel Torga, em que os fonemas oclusivos me põem diante da violência das ondas
contra qualquer coisa que se lhes oponha.
Viro
as páginas de Savarin, é tarde já. Seus convites me levaram à degustação de
versos que ele não leu por impossibilidade histórica. Na meditação 17, encontro
o repouso: “[ele] conduz ao sono, e o sono produz os sonhos”, ao “granzoal azul”...
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