No sábado, dia 6 de maio, estive no
lançamento de Minha pátria é minha
língua. Identidade e sistema literário na Galiza de Otto Leopoldo Winck
(Curitiba: Appris, 2017). Fui até o Mezanino das Artes dar um abraço no amigo e
comprar um exemplar para uma amiga. O meu livro estava bem seguro em casa, ele
me fora dado pelo autor antes do lançamento. Por quê? Porque eu prefaciei a
obra e o autor fez a gentileza de me dar um exemplar de presente.
Foi a segunda vez que escrevi um
prefácio para um livro. O primeiro foi para A
Comunidade vence o indivíduo: a regra monástica de Isidoro de Sevilha (século
VII) de Renan Frighetto (Curitiba: Prismas, 2016). No caso de Otto, Minha pátria é minha língua é
essencialmente a sua Tese de Doutorado; no caso de Renan, ele encarou a revisão
crítica de sua Dissertação de Mestrado que todo mundo vivia pedindo para que
ele publicasse. Então ele resolveu, não sem fazer ajustes. Eu também escrevi um
posfácio, para a 2ª edição de Filosofia
da Viagem de Jelson Oliveira (Curitiba: Ed. PUCPRess, 2014) e essa história
é bem engraçada e muita gente já a conhece. Eu fiz referência ao encontro na
introdução do nosso Diálogo sobre o
tempo: entre a Filosofia e a História (Curitiba: PUCPRess, 2015).
Por mais que eu tenha gostado muito
de dar um abraço no querido Otto, não foi apenas o seu lançamento ou a memória
do prefácio que escrevi para Renan Frighetto que me fez parar para pensar sobre
esse exercício. Eu estou escrevendo um prefácio no momento. Trata-se do livro A Visibilidade do Sagrado:
Relíquias Cristãs na Idade Média da minha amiga Renata Cristina
de Sousa Nascimento (UFG/UEG/PUC-GO) e da excelente colega Paula Pinto Costa (Universidade
do Porto). Na verdade, foi a convergência entre ver o resultado no caso de Otto,
estar no processo de escrita no caso de Renata e Paula, e ter lido um texto que
não tem nada a ver com essas coisas, aparentemente...
Eu recebi os 3 convites com muita
surpresa. Lembro bem: Mas, Otto, eu sou
uma historiadora...; Mas, Renan, por
que não pede a alguém melhor que eu?; Renata,
tem certeza?. Eles deram explicações que me lisonjearam, sobretudo porque
sabem que eu dificilmente me sentiria constrangida a não apontar minhas
discordâncias. No caso recente de Otto, cheguei a pedir para tomarmos café,
pois eu precisava lhe dizer algumas coisinhas (opiniões divergentes). Tomamos
café, eu falei e ele, que é ótimo, disse: Fica
à vontade! Não dava para negar o abraço no sábado...
Eu já pedi prefácios. Pedi a quem
eu confio de olhos arregalados[1]
e a quem não vai me “proteger”, mas que entende a minha mente (eita,
dificuldade...), como poucos! Eles e elas corresponderam a todas as minhas
expectativas, ou seja, superaram tudo o que eu poderia imaginar que
escreveriam.
Escrever um prefácio é realizar
um exercício de escrita como primeiro leitor de um texto. Isso é sim uma grande
resposabilidade, porque muitas vezes quem procura o livro vai ao sumário e ao
prefácio antes de tudo. Nesses lugares, testa a sua necessidade da obra. É
também uma grande responsabilidade, porque não há tábuas de salvação, ou seja,
não dá para se apoiar em ninguém, afinal ninguém ainda leu! Você está sozinho
com o livro e com a expetativa de quem te pediu uma coisa dessas... Vai que a
gente não gosta do livro? Vai que o autor que pediu não gosta do que a gente
escreveu?! Dilemas...
Ontem, folheando meu Rascunho de maio[2],
a 1ª parte do texto de Fernando Monteiro: “Afinal, estamos escrevendo para
quem?”, pensei em outro aspecto do exercício de prefaciar. O texto de Monteiro será
finalizado apenas na edição de junho e, embora aborde o caso da ficção, o
dilema: “mercado ou ralo de fossa” me sugeriu outros dilemas para escrita
acadêmica... Confesso que multipliquei as alternativas de Monteiro e cheguei a
escrever aqui, mas depois de uma relida, vi que podia reduzir minhas propostas.
Ensaio uma questão a partir da sugestão de Fernando Monteiro: os livros
acadêmicos são escritos para quem?
Os livros acadêmicos são escritos
para os pares, para outros pesquisadores; para os estudantes; para professores
de outros segmentos da educação; para interessandos nos temas que nos encantam
e que não são especialistas (caso bem raro...) e para os avaliadores de áreas.
Quem escreve tem em mente um, dois ou três desses públicos. As tiragens estão
relacionadas a esses públicos e o que se faz depois de o livro pronto também
revela muito do nosso para quê... Afinal, os escritores acadêmicos trabalham
seus livros, falam deles, as obras são submetidas a debates, exames para além
do clube do livro das áreas?
Monteiro diz no texto dele, com
certa amargura (acho) que: “cada sociedade tem, afinal, a literatura que
merece”. Eu fiquei pensando no dilema que ele detectou/propôs e nesse nosso
merecimento, no meio acadêmico. Nesse sentido, prefaciar para mim é projetar
públicos. É avaliar qual foi o leitor imaginado pelo autor quando escreveu e
tentar atrair outros, não de forma ordinária ou desonesta, mas surpreendente
para o autor! A tese de Otto foi defendida na área de Estudos Literários e eu
comprei o livro para oferecer de presente de aniversário a uma grande
medievalista.
Quando se escreve, é importante
refletir: para quem? Para quê? Nisso,
estou com Fernando Monteiro, até em sua desilusão... Mas como tenho o hábito de
arrumar a cama antes de sair de casa ou meia hora antes de deitar, mesmo que
isso seja talvez toc, ou talvez démodé, acho que um bom caminho é lermos de
verdade uns aos outros. Prefaciar é ler atentamente um outro que nos escolheu e
que nos pediu, a despeito de tudo o que podíamos considerar sobre a sua obra
prima! Confiança e sinceridade. Taí um tímido binômio que não tem a ambição de
superar qualquer dilema..., apenas alisar o lençol. Não sei se Fernando
Monteiro concordaria, ou se chegaria a ler esse 100º texto de Literistórias.
Epílogo:
Eis que o blog LITERISTÓRIAS chegou ao 100º texto
publicado! Nesse 1 ano e 10 meses, publiquei: crônicas da vida
acadêmica, ou seja, textos que nasceram de minha prática docente, como
Professora de Literatura que fui (na PUCPR) e de História Medieval que sou (na
UFPR), e de minha prática como pesquisadora, junto a um Programa de
Pós-Graduação e em um laboratório de pesquisa muito ativo, o NEMED (Núcleo de
Estudos Mediterrânicos); contos; traduções; crônicas literárias; colaborações de colegas; resenhas
(de filmes, livros e evento); entrevistas; notícias; polêmicas e
esclarecimentos. Anunciei a publicação de meus livros, compartilhei imagens
(algumas feitas por mim, outras copiadas da internet). Tudo começou porque eu
queria escrever sobre coisas que não cabiam nos meus artigos e livros
acadêmicos, porque eu gosto de escrever, porque precisava/preciso me manter em
exercício constante de escrita... Nesses quase 2 anos, descobri também que esse
blog divulga textos, mas encena sobretudo minha
história particular de amor pela leitura. É porque leio (muito) que
escrevo; é porque adoro ler, que gosto de me esparramar em/com palavras...
Agradeço sempre às pessoas (muitas delas são completamente desconhecidas para
mim!) que visitam esse blog e compartilham meus textos. Obrigada pela leitura,
é bom saber que esse lugar favorece encontros, muito respeitosos, é claro
rsrsrs.
[1] Remeto o leitor à minha crônica “Por que
confiar cegamente?”: http://literistorias.blogspot.com.br/2017/03/por-que-confiar-cegamente.html
[2] O texto ainda não está no site. Eu li na
versão impressa que recebo em casa. Mas visite o site, para ler outras coisas
excelentes: http://rascunho.com.br/
Marcella, Gostei muito do texto! Obrigada! E o que dizer das introduções, ou dos prefácios dos próprios autores? Podemos conversar sobre. É um mundo de intenções e convenções. Parabéns pelo número 100. Andréa
ResponderExcluirDe fato... As introduções e prefácios dos próprios autores talvez fiquem entre "entregar o ouro" e manifestar/tentar a tal sinceridade... Faz pensar, querida Andréa. No caso dos meus cronistas, é uma carta de intenções e convenções mesmo! Muito obrigada pela leitura! Beijão.
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