quinta-feira, 8 de julho de 2021

O gosto das coisas em uma 5ª feira

 

Eu já escrevi aqui no blog que uma amiga despertou em mim o gosto da manga. Foi em 2018, depois que papai se foi e ela me recebeu na casa dela para partilhar a mesa e me abraçar no luto. Diante da mesa farta, preparada por ela com tanto carinho, o amarelo de uma manga – fruta de que nunca gostei! – tão bem cortada me chamou, e hoje a manga é uma das minhas frutas favoritas.

Eu sou uma comilona. Não é que eu coma muito, embora às vezes..., é que gosto da boa mesa, sou formiga, gosto do papo da mesa, da cozinha – quando ela é compartilhada e há música então! Ê Senhora! Batatinha roxa/Coração magoado... – gosto de cozinhar, gosto de ficar lá e até de lavar a louça! Mas eu também gosto muito de provar. Quando eu viajo, uma coisa é certa: vou atrás do gosto das coisas. Eu considero a mesa do lugar tão valiosa quanto o museu que aguça a minha fome de saber, e eu não sou exceção obviamente. Muita gente que conheço coloca essas coisas em pé de igualdade. Comilões se atraem... Eu acrescento ainda a esse gosto o correr pelas ruas do lugar em que me hospedo, bem cedinho. Experiências sensoriais.

Minha gatinha, a Sugar, tem mania de comer flor. Como eu tenho recebido flores ultimamente, ela está meio voraz. A gente tem medo, não sabe bem em que flores ela pode saciar a curiosidade gastronômica. Então é um tal de os vasos se movimentarem pela casa, para enganá-la, que é a maior confusão! Água pelo chão...

Nessa história do gosto das coisas há uma outra experiência que me fascina e sobre a qual eu nunca escrevi: o gosto compartilhado. Essa experiência tem um quê de tara, reconheço. Não raro eu gosto de provar um sabor que sei que é o favorito de quem eu amo. Essa perversão nem sempre tem consequências boas para as minhas papilas gustativas..., afinal mesmo que a gente ame alguém, que tenha grande sintonia com esse alguém, o prato favorito pode ser a exceção. A questão é que, quando o gosto favorito do outro encontra o meu, há um transporte íntimo que me dá uma alegria genuína. Invade e transborda.

Minha filha gosta de chocolate. Eu, nem tanto... Mas sou capaz de me aproximar do gosto dela e envolver tudo isso em um sorriso eterno quando eu compro sorrateira um dos seus favoritos e como um pedacinho...

Hoje, eu vou conversar na TV Kotter com Daniel Osiecki sobre um amigo que temos em comum e que partiu há algumas semanas, o Prof. Jayme Ferreira Bueno. Eu me lembro que, em algumas visitas que ele e D. Francisca me fizeram no Natal, eles me levavam umas bolachinhas que D. Francisca fazia. Bolachinhas muito alvas, que ela envolvia em um papel também muito alvo. Às vezes a embalagem era caseira, com fita guardada, como as que eu tenho aqui também. Eu posso ver! Sentir. Honestamente, nesse dia, em que as memórias dele e dela estão tão vívidas, a memória do gosto dessas bolachinhas é pura saudade, como as de um certo empadão goiano em casa amiga.

Saudades.

Hoje, de manhã, eu saí rapidinho para comprar duas coisas que esqueci de incluir na minha lista de compras do mês, feitas ontem naquele espírito bélico com que temos ido ao mercado. Na volta, entrei em uma padaria que vende um pão de nozes de que gosto muito, mas que tem a preferência de uma pessoa que amo e que está muito longe. Trouxe o pão para casa com o cuidado com que a gente leva aquele filhote de cachorro ou gato com quem sonham os filhos. Depois da higienização dos itens necessários e do banho – acho que a gente nunca foi tão limpo! – eu fui devagar ao pão. Ele é enfeitado de nozes, mas também tem nozes na barriga. Cortei e vi que o que eu tinha escolhido estava particularmente grávido. Junto às nozes, os damascos e as ameixas de que não gosta tanto a pessoa em quem eu pensava. Eu ri disso... Até o não gosto é uma experiência de saudade! A massa mais escura, adivinho farinhas diversas... Como e imediatamente vivo aqueles minutos proustianos que me fascinam desde o tempo que eu não sabia que o escritor os tinha elevado ao sublime.

As bolachas de D. Francisca, o empadão e as nozes em pão grávido de sabor. Tara. Experiência sensível. Saudade.

 

Bom dia para quem gosta de comer, tem memória e sente falta de reunir um povo à mesa!


O pão da saudade


6 comentários:

  1. Bom dia, agora já boa noite. Eu gosto de comer, tenho memória e muita, mas muita saudade de fazer uma refeição ao redor de uma mesa com o povo todo!
    E lendo seu texto, fiquei com águas na boca. Sim, águas, no plural.

    ResponderExcluir
  2. Querida Wal, muito obrigada pela visita no blog. Saudades de me sentar à mesma mesa que vc! Beijão!

    ResponderExcluir
  3. Ao ler o seu post, lembrei-me das comidas que eu não como nem provo. Acho que tem coisas que a gente não faz mesmo que amemos a pessoa que as gosta.

    ResponderExcluir
  4. Borgata Hotel Casino & Spa - Mapyro
    Find directions, reviews and information for Borgata Hotel Casino & Spa in Atlantic City, NJ. Borgata 제주 출장샵 Hotel Casino & Spa is a 영주 출장샵 Casino 포천 출장안마 in Council 전라북도 출장마사지 Bluffs, New 거제 출장안마 Jersey

    ResponderExcluir