quinta-feira, 23 de julho de 2015

Minhas regras - crônica

- Filha, o que você está fazendo em pé na cama?
- Pai, minha cama, minhas regras.

Sentiu o chão desaparecer. Abraçou-se ao travesseiro como a um paraquedas que não vai abrir... e viu a filha no meio da Praça de São Pedro no Vaticano, nua da cintura para cima, com palavras de ordem pintadas no corpo; viu quando a polícia chegou e dispersou seu grupo; viu-a, bem como as amiguinhas do colégio, rindo depois de uma corrida desenfreada; viu-a pintando com seus lápis de cor preferidos a mulher nua na praça do homem nu, no coração da cidade em que nasceu. Enquanto caía, viu ainda a filha em maio de 68, berrando em Nanterre; viu-a machucada, mas de pé; viu-a tirar o véu depois de ler Qâsim Amîn; viu abraçar-se à Hoda Shrawi e pedir a palavra no Cairo, em 1944. Viu-a no primeiro beijo roubado por ela. Viu-a aceitar o abraço de um homem apaixonado às lágrimas... Viu o chão cada vez mais perto e, quando ia bater com a cara no chão, sentiu uma pequena mão salvá-lo pela camisa do pijama.

- Pai, faz meu café da manhã?

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